Um casal de vizinhos, que na labuta
diária, costuma travar longos e intermináveis diálogos, começou, no dia de
hoje, logo cedo.
Uma manhã linda e ensolarada de
verão, aquelas que o calor do sol só aquece e alimenta sem causar enfado, o
casal, de repente, começa a dialogar; diálogos que são ouvidos ao som de alta
voz; às vezes, parece mais que estão brigando um com o outro; entretanto, tenho
a impressão que a fala alta faz parte da cultura do casal.
A mulher que, parece lavar roupa – ideia
suposta a partir do barulho incomodador que ouço de uma máquina – faz uma
reclamação do esposo por conta de sua estadia fixa e permanente em casa. Parece
falar sozinha, reclamar da sorte. Mas, de repente, mais ao fundo, ouve-se a voz
do marido a dizer.
-
Mulher, como vou trabalhar? tu sabe bem que não posso. O médico mesmo me disse.
-
Claro que pode! - falou a mulher. Mas
não sei o que tu quer. Vive reclamando da vida, enchendo o saco, mas não tem
coragem de pegar nem um “bico” porque quer ganhar sempre mais do que merece;
mas isso é desculpa pra não trabalhar, seu burro!
O marido, com voz exaltada, retruca
dizendo que burro seria se cobrasse pouco pelo serviço que supostamente
prestaria e insiste repetindo que não tem condições de trabalhar por ser
debilitado fisicamente. Nessa constante, marido e mulher começam a acusar um ao
outro e, já faltando repertório para a discussão, o marido começa a elencar as
doenças que possui para reafirmar a invalidez que o impossibilita de trabalhar.
Por conseguinte, ouve-se a disputa de
quem carrega mais doenças. O marido diz que possui o tornozelo deslocado, para justificar
que não trabalha por conta disso; a mulher grita que tem deslocada a clavícula
e que, apesar disso, não para de trabalhar.
Marido:
Tenho tendinite na mão direita
Mulher:
E tu sabe que tenho má circulação
Marido:
Minha pressão tá sempre alta
Mulher:
Alta é tua preguiça. E eu que tenho diabete?
Marido:
Isso não é nada perto da minha gastrite.
Mulher:
É... tu tem tudo de ruim mesmo. E enquanto isso, eu é que coloco dentro de casa
o pão.
Depois deste embate sem vencedor, o
silêncio compadece-se de mim e então, por alguns momentos reina. Ouve-se, muito
a distância, o som do coração insistindo em bater. Bom, ainda há vida. E eu, que calado
observo tudo, fico aqui a refletir: “é melhor ser surdo ou escutar”?!
Liliana Almeida